O principal teste usado para diagnosticar o novo coronavírus (chamado PCR) pode estar captando fragmentos de vírus mortos de antigas infecções, dizem cientistas em um estudo recente.
Nesse caso, pessoas podem estar recebendo diagnósticos positivos de infecções antigas ou que já não estão mais ativas.
Carl Heneghan, do Centro de Medicina Baseada em Evidências da Universidade de Oxford e colegas revisaram estudos científicos nos quais espécimes de vírus de testes positivos foram colocados em uma placa de Petri, de forma a avaliar se essas espécimes cresceriam.
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Esse método de "cultura viral" pode indicar se o teste positivo de fato captou vírus ativos, capazes de se reproduzir e se espalhar, ou se captou fragmentos de vírus mortos, incapazes de crescer no laboratório ou em um corpo humano.
Em texto publicado em agosto, Heneghan afirmou que, embora os dados sobre culturas virais em testes PCR sejam esparsos, "há evidências de uma relação entre o tempo da coleta de uma espécime, a severidade dos sintomas e as chances de alguém ser infeccioso".
De um lado, ele e seus colegas argumentam que uma possível testagem excessiva em que muitos "vírus mortos" sejam detectados pode levar a uma superestimativa da atual escala da pandemia, além de dificuldades em se criar estratégias eficientes de isolamento.
"A detecção via PCR é útil desde que suas limitações sejam entendidas", escreveu o pesquisador em seu artigo de agosto. "(...) Se isso não for entendido, resultados de PCR podem forçar restrições para grandes grupos de pessoas que não representam um risco de infecção."
Heneghan acredita que a detecção de vestígios de vírus antigos pode ajudar a explicar por que, em alguns lugares, o número de casos de coronavírus continua a crescer mesmo sem que isso se reflita em uma alta no número de hospitalizações. Ele também defende mudanças na forma como o resultado dos testes é entregue aos pacientes (veja mais abaixo), de modo a deixar mais claro o perigo de contágio.
Em contrapartida, alguns especialistas pedem cautela na correlação entre o desempenho do vírus em laboratório e sua capacidade em infectar fora dele.
O teste PCR, feito com um swab colocado na narina, é o principal método de detecção do coronavírus. Ele usa químicos para amplificar o material genético do vírus, para que este possa ser diagnosticado e estudado.
A amostra de um paciente tem de passar por um número suficiente de "ciclos" em laboratório até que algum vírus seja encontrado. O número de ciclos vai indicar quanto vírus há na amostra - se apenas fragmentos ou grandes quantidades de vírus inteiros.
Isso, por sua vez, parece estar relacionado à probabilidade de o vírus ser de fato infeccioso - vírus de testes que têm de passar por vários ciclos parecem ter menor tendência a se reproduzir quando cultivados em laboratório, embora isso não esteja plenamente claro, segundo alguns pesquisadores.
Mas, quando você faz um teste de coronavírus, recebe de volta apenas uma resposta de "sim" ou "não", sem nenhuma informação adicional de quanto vírus havia na amostra ou qual a chance de ele provocar infecções.
Ou seja, uma pessoa carregando uma grande quantidade de vírus ativo e uma pessoa com pequenos fragmentos de vírus de uma infecção já curada podem acabar recebendo o mesmo resultado - no caso, "positivo" - de seu teste.
Por isso, Heneghan defende que os testes, em vez de apenas prover um resultado "sim/não" com base na detecção do vírus, deveriam ter uma linha de corte para impedir que ínfimas quantidades de vírus não levem a um resultado positivo.
Um dos estudos que ele analisou investigou a cultura viral em amostras de um grupo de pacientes e comparou os resultados com as datas dos testes e o tempo em que seus sintomas passaram.
Os dados, diz ele, mostram que a probabilidade da infecção pelo coronavírus era maior variava conforme a linha de corte usada.
Não seria possível checar cada teste feito para avaliar se o vírus detectado está ativo, acrescenta ele, mas seria possível reduzir as chances de falsos positivos se cientistas determinassem qual seria essa linha de corte.
Isso ajudaria a prevenir que pessoas recebam eventuais diagnósticos positivos derivados de infecções antigas. Também daria um entendimento melhor da atual escala da pandemia e evitaria que algumas pessoas fossem colocadas em quarentenas mais rígidas (e tivessem seus contatos rastreados) sem necessidade.
Além disso, diz Heneghan, o PCR, por ser um teste altamente sensível, está vulnerável à contaminação por agentes externos. Portanto, para evitar falsos positivos também por esse motivo, locais que estejam aumentando sua capacidade de testagem devem fazê-lo com um rígido controle de segurança laboratorial.
No Reino Unido, a agência governamental de saúde Public Health England afirmou estar trabalhando junto a laboratórios para reduzir o risco de falsos positivos, inclusive analisando como criar um "limiar" do ciclo de análise viral, de forma a criar essa linha de corte.
No entanto, a agência destacou que existem no mercado diferentes kits de testes sendo usados, com diferentes limiares e leituras, o que dificulta a criação de um padrão único e geral.
O professor Peter Opeshaw, da Universidade Imperial College London, diz que o PCR é um método altamente sensível de se captar material genético residual de vírus, mas que isso não equivale a "evidência de atividade infecciosa".
No momento, acredita-se que as pessoas infectadas sejam capazes de passar o vírus adiante até o décimo dia de sua infecção, diz ele.
Ao mesmo tempo, o professor Ben Neuman, da Universidade de Reading, afirma que não se deve fazer uma correlação simplista entre o cultivo do vírus em laboratório e o potencial infeccioso deste em humanos.
"Essa revisão (feita por Oxford) corre o risco de falsamente correlacionar a dificuldade em cultivar o Sars-CoV-2 de uma amostra de um paciente com a probabilidade com a qual ele vai se espalhar", afirmou.
Heneghan também destaca, em seu artigo, que "atenção insuficiente" tem sido dada a como resultados do exame PCR se correlacionam, de fato, à capacidade de infecção do paciente e que mais estudos são necessários.
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